A nudez castigada.
Apesar de atrevido e ousado, o escritor Nelson Rodrigues foi polêmico também por posicionamentos contraditórios que, à primeira vista, deixavam transparecer um homem com moralismo exacerbado. Não se tratava nada disso, mas de a perspicácia e a sabedoria de um observador da sociedade brasileira que percebia desmandos e perdas de valores acelerados. Quando sua peça “Toda nudez será castigada” se tornou pública, percebeu-se que, acima de falso ou rançoso moralismo, havia, na visão rodrigueana, a percepção apocalíptica de caos dos tempos.
De lá para cá, tudo piorou em nível de costumes, de valores e até mesmo de princípios nacionais. Valores de mercado atropelaram as últimas balizas fincadas e destruíram referenciais. A mulher brasileira – e, também, o jovem macho – tornou-se, com o silêncio cúmplice e acovardado dos antigos movimentos feministas e de direitos da mulher, um símbolo vulgar e banal da sexualidade desbragada. Corpos nus deixaram de ser exceções ou ousadias para se transformarem quase que em regra num país que passou a ser conhecido, no mundo todo, como o paraíso do “sexo livre” e, também, de todas as formas possíveis, prováveis e imagináveis de turismo sexual, incluindo pedofilia.
Neste último Carnaval, uma escola de samba perdeu meio ponto – que não interferiu em sua classificação – no desfile carioca, pela atitude vulgar de uma sambista em se apresentar com um mínimo tapa-sexo, como foi chamado, de apenas 3,5cm. Ora, o que pretende uma mulher, apresentando-se nua aos olhos da multidão, senão oferecer-se sexualmente da maneira mais barata e banal, comercialmente falando, já que se trata realmente de comércio sexual? E o que pretende o Brasil, no mundo globalizado e de comunicação eletrônica rapidíssima e universal, mostrando-se despudoradamente às demais nações? Se De Gaulle falou ou não – e falou, sim, tentando remediar depois – que o Brasil não é um país sério, muitos motivos houve e há para essa consideração.
Essa nudez da carne jovem brasileira – explorada em revistas, em televisões, na internet – não revela apenas ousadia ou perda de valores entre os quais os da vergonha e do pudor. Revela, às escâncaras, o que vai pela alma brasileira, que se vai desnudando em todas as formas de corrupção, de licenciosidade, de desrespeitos, de aceitação de degradações morais e cívicas. Se jovens perdem o pudor nos desfiles, nos bailes, nos clubes, nas praças públicas, se emissoras de tevê perdem o pudor com programas como Big Brother – por que haveriam de ter pudores e respeitos diante da lei, das normas, incluindo as mais comezinhas da vida social.
A nudez brasileira está sendo castigada. Não apenas a do corpo. Mas a do espírito que se despiu de seus valores.