“Relaxa e compra”

Parece que o poço não tem mesmo fim. Quando se pensa ter chegado ao fundo, sempre surgem novos espaços. A queda para o abismo, em termos civilizatórios, é profunda. O Brasil, assim, pensa poder crescer e desenvolver-se aos tropeços, entre murros e tapas – mas isso será apenas inchaço. Crescimento é harmonia. E, em relação a um país, essa harmonia não pode prescindir do respeito e da civilidade.

Marta Suplicy nunca mais irá, certamente, recompor-se da grosseria que cometeu quando, opinando sobre a crise dos controladores de vôo e a impaciência dos passageiros, cometeu a frase inadmissível para uma senhora de fino trato: “Relaxa e goza.” Foi perda de compostura, agravada pelo fato de Marta Suplicy ter nascido e vivido em famílias das mais requintadas deste país. Se as tais senhoras de “fino trato” se permitem grosserias adequadas a portas de botequim, agravadas em sua condição de Ministra de Estado – como, ainda, acreditar que o “exemplo deve vir de cima”? O País perde a compostura quando seus dirigentes deixam de tê-la.

O amargo, nessa caminhada dolorosa do Brasil para deixar o fundo do poço, é que as lições não se aprendem, erros de alguns não servem para que outros os evitem. Vivemos tempos em que parece haver uma competição para se ganhar o troféu da grosseria, da malandragem, do desrespeito, das gracinhas insultantes, do mau gosto, da falta de seriedade. O “relaxa e goza” de Marta Suplicy fez escola, mostrando, ainda outra vez, o pouco valor que algumas empresas de publicidade dão a questões éticas e de civilidade.

O anúncio de uma marca de automóveis – onde um ridículo cidadão faz imitação grosseira e agressiva à Ministra – deveria ser tomado como exemplo de desrespeito para ser exibido às escolas brasileiras, especialmente, talvez, às faculdades de comunicação. Se Marta Suplicy errou, foi grosseira e infeliz com seu “relaxa e goza”, a Peugeot permitiu que essa grosseria fosse suplantada por seus publicitários, numa sátira sem qualquer compromisso com o respeito e o bom senso. A Peugeot entra na onda da galhofa, da piada irresponsável, na perda da dimensão de escala de valores. Se Marta Suplicy não conseguirá livrar-se de sua grosseria insuportável, a Peugeot escolheu o mesmo caminho, nivelando-se por baixo.

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