A HISTÓRIA QUE EU SEI (116)

De réu a vítima
Um fato curioso: a divulgação daqueles depoimentos levou-nos, diretores de jornais – Losso Neto e eu – a amargar um processo por divulgação de fatos e palavras “atentatórias à moral pública”. No entanto, o Prefeito João Herrmann Neto – ao recompor o seu secretariado e a reorganizar-se politicamente com a Câmara Municipal – escapou do processo de cassação de mandato… A maneira, porém, como aqueles depoimentos foram publicados acabou por causar efeito contrário: o Prefeito João Herrmann Neto, réu de grave crime contra o decoro do cargo, passava a tomar-se vítima da imprensa, de seus ex-colaboradores, dos políticos. João Herrmann Neto conseguia reverter a situação em seu favor. Num momento em que a imprensa brasileira começava a dar destaque especial a atos e acontecimentos de oposição ao governo militar, o prefeito de Piracicaba conseguia grandes espaços na mídia nacional, apresentando-se como vítima de um complô da burguesia, vendendo a imagem – que foi comprada pela imprensa – de estar em vias de perder o cargo por ter buscado implantar, em Piracicaba, uma administração voltada para o povo e com cunho e inspiração socialistas.

Do “Mar de Lama”, João Herrmann Neto emergia como vítima e herói. As camadas populares da população manifestavam-lhe apoio, solidarizavam-se com ele .. Sedimentava-se, assim, uma liderança popular e “populista”, a primeira, desde Francisco Salgot Castillon, num tempo em que novos ventos começavam a soprar, anunciando outras transformações. Tinham início, naquele 1978, as corajosas greves no ABC paulista, surgindo a liderança forte e nova do metalúrgico Lula. O Presidente Geisel revogava os atos institucionais, a abertura política em direção à democracia começava a ser mais do que uma simples esperança. O General João Batista Figueiredo, indicado Para suceder a Ernesto Geisel, mandava um recado: “Eu prendo e arrebento”, referindo-se aos que quisessem impedí-Io de redemocratizar o país. O filme que fazia sucesso em todo o país pela ousadia do tema era “Lúcio Flávio, o passageiro da agonia”, discorrendo sobre o “Esquadrão da Morte”. Havia, porém, contradições: ao mesmo tempo que se prenunciavam ares de liberdade – como a entrevista do mito e líder comunista Luiz Carlos Prestes, à revista “Isto é” – a censura impedia a exibição da novela “Roque Santeiro”, de Dias Gomes, do livro “Feliz Ano Novo”, de Rubem Fonseca, da peça teatral “Rasga Coração”, de Oduvaldo Vianna Filho. O mundo ficaria perplexo com o seqüestro, na Itália, do líder democrata-cristão Aldo Moro. Em Piracicaba, a UNIMEP passava por grandes transformações, com a queda do Reitor Edward Senn e a posse de Elias Boaventura, substituindo-o, num clima passional e festivo. Ao lado das complicações políticas, um acontecimento que enternecia a cidade: Dona Branca de Azevedo, respeitada líder política e feminista, completava 100 anos de idade.

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