Mais vereadores?

Há dezenas de anos, a sabedoria do povo forjou a imagem que ainda sobrevive: “O Brasil cresce à noite, quando os políticos dormem; e diminui durante o dia, quando os políticos agem.” O povo, por mais ame e queira a democracia, já tem graves e sérias dúvidas quanto às estruturas democráticas brasileiras. Sabe-se, sim, que “ruim com tal Legislativo, pior sem ele”. Pois a democracia precisa, para sobreviver, de um parlamento onde o povo se sinta representado. O grave problema é a representação, seus vícios, estruturas pérfidas, sistemas político-partidário-eleitorais absolutamente ultrapassados.

Não há negar esteja, o Brasil, numa fase auspiciosa de transformações, de desenvolvimento, reconhecidos no mundo inteiro. Quando já se prevê estarmos, dentro em breve, entre as cinco maiores potências econômicas do mundo, não há mais motivos para se duvidar, como se fosse um ufanismo superficial. Não é. O Brasil finalmente engrenou, apesar dos escândalos, da corrupção, de uma classe política que se vai demoralizando a si mesma, mais e mais, a cada dia que passa. E não se diga tratar-se apenas de Brasília, pois a degeneração dos costumes políticos atinge também assembléias legislativas e câmaras municipais.

Há um flagrante e melancólico descompasso entre a arrancada nacional para o desenvolvimento e as estruturas políticas do país. E são mínimas as perspectivas de que algo melhore no universo político-partidário, pois as reformas urgentes e necessárias estão sendo feitas superficialmente e pelas mesmas raposas que tomaram conta do galinheiro. Seria de uma ingenuidade absurda esperarmos que deputados e senadores propusessem e votassem reformas que precisariam cortar-lhes a própria carne, desfazer privilégios, dar seriedade ao regime, depurar vícios e, acima de tudo, criar um verdadeiro e justo sistema de representação política. Como mudar a tribo, se os caciques é que têm o comando?

Ainda agora, quando se fala em reforma eleitoral, a pantomima é dolorosa. Não há reforma alguma, a não ser um que outro ajuste na propaganda eleitoral, permanecendo os mesmos vícios, com os mesmos caciques e os mesmos sistemas de escolhas de candidatos que apenas serão coonestados por um eleitorado cansado e sem esperanças. O Congresso Nacional perdeu a credibilidade e as suas últimas decisões – ou falta delas – fazem prenunciar enxurradas de votos nulos e brancos, o que, mesmo sendo uma forma de protesto, acabará beneficiando justamente os piores. Que são os donos de currais eleitorais e rebanhos fiéis, especialmente eleitores que seguem a voz de “pastores” como questão de fé. Sem uma grande revolução estrutural em todo o sistema político, o Brasil continuará crescendo durante à noite, enquanto os políticos dormem, para desacelerar durante o dia, quando eles estão acordados. E bem acordados. Para si mesmos.

Veja-se, agora, a imoralidade da questão do aumento de número de vereadores nos municípios. É outro tapa na cara da população. Para quê mais vereadores, já que não se sabe mais para que eles servem, tal o desvio de funções nos cargos e nas representações? Salários altíssimos, muito acima da média do povo brasileiro, privilégios intensos e responsabilidades indefinidas. A vereança é, hoje, um dos mais ambicionados empregos do país, pois não exige qualificações profissionais, cobra apenas presença em poucas sessões, não há cargas horárias definidas, com longos períodos de férias (recesso) remunerados, vantagens que não encontram correspondente nem em grandes empresas particulares.

Tomemos, ao acaso, a situação de um vereador hoje, conforme informações eletrônicas da própria Câmara dos Vereadores. O vereador José Luiz Ribeiro, por exemplo, com grandes atividades como sindicalista e, portanto, com tempo relativo para as questões legislativas. O salário mensal do vereador é de Cr$5.583,26. Mas tem custos de sua equipe: Chefe de Gabinete, C5$3.362,65; assessores (3), 7.9327,86. E mais verbas de xerox/impressões (no mês de junho, Cr$399,61), verba para telefone (em junho, despesas de Cr$1.167,67); despesas com material de consumo e selos (Cr$347,22, em junho), além de diárias para viagens, que o vereador usou pouco. Só com o vereador José Luiz Ribeiro, o povo gastou, no primeiro semestre, Cr$116.339,13.

Fosse essa a média do custo de cada um dos 16 vereadores – e deve ser mais, pois há gastos especiais com componentes da mesa diretora e outras assessorias – beiramos os 2 milhões de reais mensais apenas como salários e regalias dos atuais edis. Há, no entanto, toda uma estrutura poderosíssima de funcionários, assessores, estagiários que implica despesas quase inacreditáveis se considerarmos a relação custos/benefícios, ou pagamentos e exigências de trabalho. Se alguém conseguir provar o porquê de uma cidade como Piracicaba precisar de mais vereadores, será, com toda certeza, candidato sério ao Premio Nobel de Mágica que, se não existe, precisaria ser inventado. Bom dia.

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