Sem direito ao desânimo.

A cada dia que passa mais me convenço de estar entre os homens – não sei se muitos ou poucos – que não têm direito à desesperança e ao desânimo. Por isso, quando medito, fazendo-me revisões e avaliações de vida, chego sempre á mesma conclusão: serei o mais ingrato dos homens sempre que, por fraqueza ou cansaço, queixar-me do que quer que seja da vida.

Infelizmente, é próprio do homem ver a árvore sem ver a floresta, lamentando-se ou alegrando-se diante de episódios ou circunstâncias, e perdendo, assim, a visão do todo. Um simples dia aborrecido tem o poder de causar a impressão de ser toda a vida aborrecida ou de ela não ter sentido. Na verdade, somos, ao mesmo tempo, mal-agradecidos e estamos mal-acostumados em relação à vida. Pois um simples arranhãozinho ao que pensamos ser felicidade basta para nos sentirmos feridos ou roubados. Ou será que fomos treinados para a lamentação diante da vida e não para a sua exaltação?

Digo-o também por mim que, muitas e muitas vezes, me queixei, me rebelei, desanimando de esperar por soluções aos graves problemas do povo? Acabo acreditando seja uma das mais marcantes características brasileiras, traço vigoroso de nossa cultura, hábito que se transmite de geração a geração: a queixa, o lamento, heranças nostálgicas de nossos avozinhos portugueses e africanos. Para nós, um pequenino ponto negro numa grande tela branca tem mais significado do que toda a brancura da tela inteira.

Confesso ter-me cansado de ouvir dizer que “o mundo está perdido”, que “a juventude não tem mais saída”, que “chegamos ao fundo do poço.” Mundos acabam, jovens amadurecem e chegar ao fundo do poço é a condição essencial para dele sair. Nada pode ser igual ao que já foi e nem o que há de ser será igual ao que tem sido. No entanto, há belezas e grandezas que se repetem, valores que se renovam, princípios que são cultivados. O problema é nosso, que parecemos sofrer dos olhos, deixando de ver.

As imagens do Carnaval estavam ainda claras, vívidas, quase assustadoras em sua crueza a cores na quarta-feira de Cinzas. Então, o moço – que se divertira no Carnaval, que amara e que se alegrara – falou como que num desabafo de cansaço ou no início de uma caminhada: “Agora, vou viver minha Quaresma. Serão quarenta dias sem bebida alcoólica e sem café.” E lá se foi ele – adulto já, profissional competente, vivendo a modernidade do mundo da informática – viver a sua nova jornada: a da Quaresma. Como falar em desesperança, como pensar em desânimo? Bom dia.

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