“In Extremis” (185) – Grandeza, inveja, tristeza

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(foto: Mike B / Pexels)

Há quem acredite esteja, o escrevinhador, a brincar ou a galhofar ao propor a instalação de uma monarquia constitucional, parlamentarista, no Brasil. Trata-se, porém, de convicção. Que adveio após muito estudo e leitura, por mais controversa, polêmica seja a questão. No entanto, está no cotidiano do povo como que uma nostalgia de uma centenária cultura monárquica. Ou seria apenas acidental criarmos tantos reis e rainhas nas atividades sociais? Rei Pelé, Rei Roberto Carlos, sucedendo a dois Reis da Voz, Francisco Alves e Agnaldo Rayol. A nossa vizinha Campinas, a Princesinha do Oeste. Copacabana, a Princesinha do Mar. Escolas como Barão do Rio Branco, Baronesa de Rezende. Um estádio de futebol: Barão de Serra Negra. Rodovia D. Pedro I, Rua Duque de Caxias. E – pasmemo-nos! – o presidente da República diz ter-se casado com uma princesa. E, recentemente, até uma Rainha do Bumbum foi coroada.

Na realidade, fui seduzido pela ideia da monarquia ainda na infância. Os Cavaleiros da Távola Redonda, as maravilhas e aventuras do Rei Arthur, o romance clandestino de Guinevère e Lancelot…  Era, ainda, a década dos 1950, o pós-guerra recente. E o Reino Unido, ainda que enfraquecido pelo conflito, mantinha o seu charme, o “aplomb” britânico. Mesmo no colégio, não se ensinava o inglês com o sotaque estadunidense, mas o britânico. É óbvio que nunca se divulgaram misérias, tiranias, crueldades, injustiças monárquicas. Pois, creio eu, torná-las públicas seria atentar contra uma crença sei já se real se imposta: o rei, a rainha eram escolhidos por Deus. E, consequentemente, tornavam-se seus representantes diretos.

Ainda hoje, há governantes que se dizem escolhidos por vontade divina. Portanto, salvadores da pátria e – por que não? – da própria humanidade. A pequenez humana desafia o mistério do tempo. De qualquer maneira e pelo menos para este escrevinhador, há uma espécie de magia que encanta – podendo até mesmo fascinar – os que a observam. Um casamento real, por exemplo, desperta a atenção do mundo. E a morte de uma rainha – como aconteceu recentemente – torna-se tragédia mundial.

Penso ainda mais seriamente nessas coisas – para mim, alentadoras – sentindo na alma a mesquinhez e a mediocridade da vida política brasileira. Especialmente em vésperas de eleições nacionais, dói-me – no velho coração de jornalismo quase septuagenário – ver o nível de disputas, de competições e, também, a incompetência de certos candidatos. O que menos existe é grandeza, isso as monarquias fazem sobrar pelo menos para efeito propagandístico. Nelas, sujeira lava-se em casa. Existe, mas não se revela. Pois tornar pública a sujeira familiar é – ulalá! – coisa de plebeu.

Quem poderia imaginar – mesmo num conto de fadas de mau gosto – um rei ficar falando palavrões em público, xingando de “nomes feios” seus adversários e assumindo, ele mesmo, ser uma criatura tosca? Cargos públicos – também nas repúblicas – têm dignidade própria. O governante apenas dignifica o cargo se mostrar-se digno dele. Trata-se, na realidade, de uma questão política, que é a arte e a ciência de servir os governados. Ora, até o Papa deve falar palavrões. Por exemplo: se bater o dedinho do pé. Ou se, no banho, o sabonete escorregar-lhe mais que duas vezes das mãos. No entanto, a decência – e o Papa sabe disso – está em saber onde e quando falá-los.

Na República do Brasil, o governante é um boca suja assumido. A própria mulher dele o reconhece. E isso me causa tristeza, vergonha e fico com inveja de monarquias. Penso em D. Pedro II…

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