Criminosos e silêncios hediondos.

Talvez, o filme “Tropa de Elite” tenha, apenas, chamado mais a atenção para o grave problema que, no entanto, é antigo e vem num crescente: o aumento da criminalidade entre os jovens da chamada e considerada “classe media”. É alarmante especialmente pelo caráter de gratuidade de que se reveste, crimes cometidos por banalidades, sem motivos ou causas aparentes, crimes torpes sem motivos torpes, essa a gravidade do perigoso fenômeno social.

Temos vivido as desculpas esfarrapadas pelo nosso fracasso como sociedade, em todos os níveis do país. O Brasil, ainda que iniciando um processo que parece seguro de desenvolvimento, descuidou, por muitas décadas, de seus valores sociais e espirituais. As décadas de ditadura tiveram conseqüências trágicas. Primeiro, porque impuseram a força como lei, determinando hábitos de impunidade e desconfiança e menosprezo em relação ao estado de Direito. Segundo, sem ser o último, por ter estimulado, na reação pela derrubada da ditadura, falsos conceitos de liberdade, um bem valioso que não existe, no entanto, sem a correspondente dimensão da responsabilidade. Caída a ditadura, o Brasil não ganhou a liberdade, mas estimulou a licença, o vale tudo, nos quais o povo sempre perde. Pois, no vale-tudo, a lei das selvas acaba por favorecer o mais forte economicamente, politicamente e mais forte também na amoralidade e na imoralidade. Licenciosidade prescinde de moral. Liberdade exige compromisso com a moralidade plena.

Jovens da classe média vêm, desde os tempos da ditadura, revelando crueldades e irresponsabilidades insuportáveis. Brasília, ainda nos tempos dos militares, era exemplo dessa fúria criminosa de jovens ricos, filhos ou apadrinhados por políticos. As crônicas policial e política do país estão marcadas por episódios de barbáries inacreditáveis cometidas por essa parcela privilegiada da juventude: curra de jovens, assassínios brutais, vinganças cruéis – crimes ocultos pela imprensa e mantidos na impunidade pela falsa justiça.

Ora, é óbvio que o tráfico de drogas existe por ser mantido por consumidores. E essa indústria da morte, bilionária e descompromissada com a nação e a humanidade só pode ser mantida por quem tem recursos financeiros, pois a multidão de pobrezinhos nada mais é, ainda outra vez, do que os catadores de migalhas, os que vivem das sobras de pratos de lentilhas. Em Piracicaba, na década de 1970, enfrentamos lutas titânicas para enfrentar e denunciar o complô da “indústr4ia de drogas” que se instalara em nossa cidade, quando de um surto de desenvolvimento local. Eram profissionais li berais, pessoas vinculadas aos poderes constituídos, policiais em diversos níveis, jornalistas, políticos, promotores e até juízes. A luta foi sem trégua. Mas o tráfico venceu, pois apenas recuou estrategicamente, para retornar, alguns anos depois, ainda com mais força.

Para, pelo menos, refletir-se sobre a gravidade da situação, basta que cada um se pergunte a razão de quase não haver noticiário, na imprensa regional, sobre o tráfico e o consumo de drogas em Piracicaba e cidades circunvizinhas. O silêncio diante do crime é cumplicidade. E se torna silêncio hediondo quando os crimes são hediondos.

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